sábado, 19 de novembro de 2022

 

“Parábola da Dracma Perdida”  (Lucas 15, 8 – 10)

“Estas Parábolas são muito fáceis de interpretar e muito claras ao informarem que o arrependimento é uma necessidade e que quando alguém se arrepende é motivo de júbilo no "céu", isto é, em nossa consciência, onde os "anjos de Deus", ou seja, as Leis Divinas nos convidam o tempo todo a praticar atos nobres diante da vida e a nos encontrar, ao invés de vivermos perdidos, praticando atos egóicos (relativo ao ego a personalidade; fala e pensa em si o tempo todo), egoísticos e egocêntricos (quando alguém se coloca no centro das atenções: narcisista; arrogante; individualista;).

A nossa cultura, no entanto, principalmente nas sociedades ocidentais, é de cultuar a culpa e a sua companheira, a desculpa, mas essa atitude é totalmente improdutiva, bem diferente do que acontece quando há arrependimento.

O processo de culpabilidade, em que se vitaliza o movimento de desamor por si mesmo, a pessoa que se culpa acaba por se julgar e se condenar, depois se punindo todas as vezes que erra. No processo da desculpa, a pessoa se desculpa sempre projetando a culpa nos outros, pois se julga, percebe que errou, mas se justifica, fugindo da culpa e projetando-a em alguém ou em algo, até em Deus ou na vida.

Todos nós somos convidados a nos arrepender, por ser este um ato positivo. (...)

Quando nos julgamos, condenamos e punimos, ficamos entregues ao remorso e à culpa. As pessoas que já experimentaram estes sentimentos sabem que são intensamente tormentosos e que eles só desaparecem mediante o arrependimento, gerador do autoperdão.

A culpa nos faz sentir numa situação que requer tratamento. A consciência de culpa não seria exatamente uma consciência, na acepção mais profunda do termo, mas uma pseudoconsciência, um processo de perversão da consciência.  (...)

Quando cometemos um erro, estamos assumindo uma postura egoica. Essa atitude equivocada pode acontecer por ignorância ou por desprezo ao que é correto, o que continua, de certa forma, sendo ignorância: a do não sentir. A pessoa já sabe que errou, mas ainda não consegue sentir isso.

Errar, portanto, é ignorar, seja no nível do conhecimento, seja no do sentimento, aquilo que está em conformidade com os princípios da Lei de amor, justiça e caridade.

Por exemplo, o mandamento cristão de "amar o próximo como a si mesmo" (Mateus 22, 39) é facilmente entendido no nível do saber, mas senti-lo no coração é muito trabalhoso, pois é preciso muito exercício. Por isso, o ensinamento ainda é pouco vivenciado.  

Toda atitude equivocada tem, no entanto, a sua consequência, com a qual sempre arcaremos, pois deixa em nossa consciência marcas mais ou menos profundas, dependendo do erro cometido.

Estudemos, detalhadamente, o movimento egoico relativo à culpa e o movimento essencial para dela nos libertarmos, sabendo que o movimento egoico sempre apresenta duas polaridades: uma passiva e outra reativa. Na polaridade passiva, temos o desculpismo, e na reativa, o culpismo.

O processo do culpismo é formado por três atitudes: julgamento, condenação e punição, que pode ser tanto de si mesmo, como dos outros. 

Diante de um ato equivocado cometido, a pessoa se autojulga, considerando a ação errada, por isso se autocondena e posteriormente se autopune, para sofrer as consequências de seu erro. Em algumas pessoas, seguindo-se à autopunição, existe uma quarta atitude, que é a de autopiedade, quando, sentindo-se uma coitada, sofre dolorosamente, sem cogitar sobre o perdão.

O mesmo fazemos com relação aos erros dos outros: julgamos, condenamos e punimos os que consideramos culpados. Percebamos que esse é um processo de pseudoconsciência e de pseudorresponsabilidade, pois com esse movimento a pessoa não muda, em nada, o ato praticado.

O processo do desculpismo também é formado por três atitudes: julgamento, justificativa e irresponsabilidade.

Diante de um ato equivocado, a pessoa se autojulga, considerando a ação errada, mas ao invés de se autocondenar, como no processo anterior, se autojustifica, buscando culpar outras pessoas, imaginárias ou reais, como a sociedade, o governo ou até Deus, pelo seu equívoco, assumindo uma conduta irresponsável, tentando fugir do erro praticado, como se isso lhe fosse possível.

Da mesma forma que no culpismo, podemos usar, também, o desculpismo com os outros; quando percebemos algum comportamento errado nas pessoas, nós o justificamos de forma irresponsável. Normalmente agimos assim com pessoas próximas a nós, a quem dizemos amar, mas às quais, na verdade, envolvemos com pseudoamor, conivindo com seus erros.  (...)

Quando se cai, exige-se um esforço para se levantar. Todo corpo precisa se esforçar para manter-se de pé. Ficar caído parece mais cômodo, além de causar nas outras pessoas uma comoção, mas nessa postura de pseudoamor, de autopiedade, o que a criatura recebe são migalhas de afetividade.

Quem se culpa não assume a responsabilidade de se conduzir na sua vida. Opta pelo mais fácil, que é sofrer e se sentir um coitado, em vez de tomar nas mãos a responsabilidade por construir a própria felicidade com o necessário esforço pessoal. Por essa razão, o ato de culpar-se, em um nível profundo de análise, é um movimento de fuga.  

Para nos libertarmos, tanto da culpa, quanto da desculpa, necessitamos cultivar o processo do arrependimento gerador da ação responsável. Ele é fruto da observação amorosa, tanto de nós mesmos, quanto dos outros, e com ele nos responsabilizamos pelos nossos atos. Somente por meio do amor podemos nos libertar da culpa e da tentativa de fugir dela.

Vejamos como podemos proceder. A ação responsável é um processo de autoconsciência, composto das seguintes atitudes: responsabilização, arrependimento, autoanálise, aprendizado e reparação.

Todo ser humano é ainda imperfeito e, por isso, quando realizamos uma ação, sempre teremos dois resultados: o acerto ou o erro. O acerto, segundo a visão transpessoal, será sempre um ato de amor diante da vida. O erro, como vimos anteriormente, é um ato de desamor, evidente ou oculto, que acontece pela ignorância do não saber, ou do não sentir.  (...)

A ação responsável abrange um processo de autoexame consciente, propiciador do autoperdão, e que se inicia com a autoconsciência, na qual a pessoa se observa para perceber os seus atos, classificando-os em acertos, quando estiverem em conformidade com a Lei de amor, justiça e caridade, e em erros, quando provenientes do desamor e do pseudoamor (falso amor) que a afrontam.

Ao se perceber em erro, ao invés do julgamento gerador do remorso ineficaz e proveniente da consciência de culpa, ou da tentativa infrutífera de fuga, o indivíduo adota uma atitude responsável, não mais de autoacusação, pois, conscientizando-se do ato cometido, conclui que somente ele mesmo poderá repará-lo.

Após assumir a responsabilidade, chega ao arrependimento. Sendo o erro praticado um ato de desamor, contrário às Leis Divinas e, por isso, é de fato necessário se arrepender de tê-lo cometido.

Após se arrepender, inicia uma autoanálise do erro, buscando examiná-lo, isto é, refletir sobre o motivo pelo qual o cometeu e sobre o que o levou a agir com desamor, para poder aprender com o erro.

Percebamos, com isso, que o erro faz parte da didática divina, pois, do contrário, Ele nos teria criado perfeitos para não errar. Se buscarmos sempre nos erros cometidos um aprendizado, estaremos evoluindo, tanto com os acertos, adquirindo uma conquista-êxito, quanto com os erros, adquirindo uma conquista-aprendizado. No final, o que conta sempre é a evolução do Ser Espiritual em busca da sua iluminação.

Após ter buscado aprender com o erro, é necessário iniciar ações de reparação. A ação responsável diante da vida exige que reparemos o desamor, transformando tal atitude em atos de amor.

Portanto, o autoperdão não é uma simples anulação do erro de forma fácil, como muitos pensam, mas uma ação consciente que requer responsabilidade, arrependimento, muita autoanálise, aprendizado e reparação. Buscando praticar ações amorosas diante da vida, vamos substituindo, gradativamente, o desamor e o pseudoamor que existem em nós pelo amor, transformando as energias egoicas em energias essenciais.

Esse é o movimento interno que propicia o autoperdão. Se não se perdoa, a pessoa carrega, desnecessariamente, o fardo pesado do remorso e da culpa; se não perdoa os outros, carrega, inutilmente, o fardo pesado do ressentimento, da mágoa e do ódio. Com isso, a vida se lhe torna insuportável.

No entanto, se o indivíduo assume a mansidão e a humildade preconizadas por Jesus, poderá dar-se a oportunidade de refazer o caminho, por meio do autoperdão: Mateus, 11, 28 – 30 à "Vinde a mim, todos os que estais cansados e oprimidos, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo, e aprendei comigo, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para a vossa alma. Porque o meu jugo é suave, e o meu fardo é leve.".  (...)

Somente cultivando o autoamor é que iremos evoluir, e não odiando a nós mesmos, no processo de culpa. Aquele que se autoama, enche-se de felicidade, cultivando as flores de amor para embelezar a própria vida e a de outras pessoas, e todo o Universo se felicita com ele.

Essa proposta dá trabalho, é certo. Ser feliz é trabalhoso, por isso a maioria das pessoas cultua a culpa e a desculpa. Um dia, porém, todos despertaremos para o mecanismo produtivo de autorrenovação, buscando, com o cultivo do amor e da felicidade, auxiliar o Universo a crescer.”

Livro: Parábolas Terapêuticas – Vol. 2.

Autor: Alírio Cerqueira Filho.

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