Avareza. (extrato)
(...)
“Ora, se as fazendas e os haveres não asseguram vida longa nem venturosa, como
se explica a fascinação que exercem sobre os homens? De onde procede tanto
apego às temporalidades do século?
Jesus
responde: vem da avareza. E, não só aponta a origem de tal vesânia (paixão, loucura), como adverte: “Guardai-vos e
acautelai-vos de toda a avareza” (Lucas 12, 15).
Sim,
de toda a avareza, isto é, das várias formas que essa terrível paixão assume,
dominando o coração do homem.
Alexandre
Herculano
(escritor, historiador e jornalista português do sec. XIX),
impressionado com os diversos aspectos do orgulho, exclama: “Orgulho humano!
que serás tu mais: estúpido, feroz ou ridículo?”
Pois
a avareza comporta aqueles três qualificativos: pode ser estúpida,
ridícula ou feroz.
A
estúpida é aquela modalidade sórdida e mesquinha que faz o homem privar-se do conforto, do necessário e até do
indispensável, perecendo à míngua para conservar intacta a pecúnia (dinheiro)
avaramente amealhada.
A
avareza ridícula é a do homem que tem no
dinheiro o seu ídolo, a sua preocupação constante e absorvente,
empregando-o, embora, no luxo, na ostentação, ou simplesmente na satisfação dos
seus apetites e caprichos.
A
feroz (de todas a mais perniciosa) é a
avareza dos açambarcadores, dos organizadores de monopólios e trustes,
cuja ambição e cupidez desmedidas não se contentam com menos que possuir o
mundo inteiro, ainda que para tanto seja mister reduzir à miséria toda a Humanidade.
Outrora, essa avareza gerou os conquistadores e os latifúndios. Atualmente,
ostenta-se nas grandes organizações comerciais e industriais, nas companhias,
nos sindicatos e empresas poderosas cujos tentáculos se alongam em todas as
direções.
Essa
classe de avareza é geralmente peculiar a homens inteligentes, ricos, astutos e
de alta cotação social. Das três, é, como ficou dito, a mais perniciosa e a que
mais danos tem acarretado à sociedade de todos os tempos. Um só avaro dessa
categoria, ou uma comandita (grupo de sócios ou empresários) de meia dúzia
deles, pode reduzir à fome uma cidade, um povo inteiro.
É
a responsável pela carestia (aumento de preços dos produtos) e pelas crises
econômicas que convulsionam (abalam, agitam) o mundo, dando origem às lutas
fratricidas (entre irmãos) que, por vezes, estendem o negro véu da orfandade e
da viuvez sobre milhares de crianças e de mulheres indefesas. É também obra
sua, nos tempos que correm, os milhões de desempregados nos países industriais,
e as pretensas superproduções nos países agrícolas.
O
trabalho suspenso; o legítimo comércio (que significa a livre troca de produtos
entre as nações), quase de todo paralisado graças às odiosas barreiras
alfandegárias (grandes impostos), são outros tantos crimes de lesa humanidade
praticados pela avareza da terceira espécie, isto é, a feroz.
As
outras duas formas (estúpido e ridículo) são mais
estados mórbidos ou doentios da alma; a feroz é que caracteriza a verdadeira avareza. Aquelas (estúpido e ridículo) prejudicam
somente os indivíduos que as alimentam; ao passo que os maléficos efeitos desta
(feroz) atingem um raio de ação considerável, incalculável mesmo.
Todavia,
os escravizados por essa cruel paixão são dignos de
piedade. Vivem iludidos; agitam-se, como todos os homens, em
busca da sonhada felicidade. Julgam encontrá-la na satisfação dos desejos, na
expansão do egoísmo. Cobiçando sempre, vão alimentando ambições, que jamais chegam
a ser satisfeitas.
Entretanto,
a nossa alma, para ser feliz, não precisa construir celeiros de proporções desmesuradas
como fez o “rico da parábola”; não precisa mesmo de um céu imenso, recamado (repleto)
de sóis refulgentes, basta-lhe uma nesga azul, onde "brilhe
a estrela do amor".
Livro:
“Em Torno do Mestre”.
Autor:
Pedro de Camargo – “Vinícius”.
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